sábado, 23 de outubro de 2010

Peregrinos


" Eu, não tão afortunado quanto qualquer anjo, não sou eterno, e acredito que as marcas que deixarei no mundo serão, provavelmente, tão fracas quanto as deixadas por uma miragem no deserto, mas posso - devo - nem que seja por uns breves instantes, brilhar, ou ao menos espalhar o brilho que encontro, ainda que só em pensamentos como os que jogo ao mar, em alguns dias. Assim, em tempos futuros, de milhões de garrafas, alguma restará provando ao meu espírito, e - quem sabe? - a algum improvável arqueólogo de almas, que eu existi.

E se, por acaso, alguém mais encontar minhas frases, ainda que desconexas e/ou de gosto duvidoso, ficará o agradável mistério de saber que diamante vivo, afinal, era esse que brilhava na sala de um hotel de Campos de Jordão, e que me fez iniciar, finalmente, um diário das minhas jornadas pelo mundo." Dedalus


A impressão que dá é a de que ou seus olhos estão turvos e confusos, ou que sua mente vagueou por um instante. Algo lido, mas incompreendido. Passei a mão no telefone, como corri não sei, porque pernas não haviam. Os dedos corriam frenéticos nos números, mas a mente não sabia o que procurava. Como o louco pendurado numa corda, sem saber subir e se salvar, tateei e descobri que não havia mais nada que eu pudesse agarrar. Por cinco segundos parei e respirei. Li novamente o que parecia um pesadelo, dos mais reais, inodoro, dormente e silencioso. Meu coração estremeceu de dor, de arrependimento, a angústia e o medo logo se aproximaram para fazer companhia, a falta do ar. Pesadelos são assim; a sensação do vácuo absoluto. Dor e desespero.

Nunca vi algo assim. Nunca todas as ironias pareciam tão macabras. A ironia do voo eterno, a ironia da gravidade até o último instante. Nunca a figura do viajante fez tanto sentido para mim. Somos peregrinos neste mundo.

Freneticamente, todos os pensamentos iniciaram a ciranda na mente, imagens e frases, tudo tão perto e agora absolutamente longe e fora de alcance. Restou o "ontem" e o "agora". Divididos pelo abismo silenciosamente contemplado. A culpa é do tempo. O tempo não pára e não parou. Não há trégua. Sempre o tempo.

A distância entre o presente e o passado é justa demais pra eu aceitar. Mas descanse. As marcas que deixou no mundo, ainda que julgadas como fracas, eu as pude ver. Encontrei suas frases e digo: sim, existem anjos. Você estava certo.

Seu diário de viagens permanecerá aberto, aos olhos de qualquer que queira contemplar.

Aliás, contemplar sempre foi minha grande motivação, ao buscar entender o universo. Na verdade, entender seria prepotência da minha parte. Apenas contemplo e me deixo seduzir, além da beleza dos diamantes, dos anjos, das estrelas. Como a criança que se encanta com algo que jamais viu, assim eu prossigo cada dia, descobrindo algo novo, mesmo que o novo não seja novo pra ninguém.

Manter-me de olhos para o céu é contemplar o visível, o invisível, e no final, sonhar. E este título não foi por acaso, você o inspirou de alguma maneira. Ao voltar os meus olhos para o céu e ver que o que há vai muito além que somente aquilo que os olhos podem ver, você me ensinou a saber mais sobre quem eu realmente sou. Um punhado de poeira cósmica!

Você me contou das estrelas. Eu errei em não te contar o que havia atrás das estrelas o tempo todo.

O tempo esta semana passou depressa demais pra mim. Aqui começo eu o diário que existia, porém vazio. Nunca escrevi. Não havia propósito real que me pusesse a escrever. Agora há.



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